ARMADILHA DO CRESCIMENTO
Ruína social e ambiental
É bom quando a gente ouve ou lê alguma coisa que reforça nossas poucas certezas e as muitas desconfianças e dúvidas, principalmente quando elas nos fazem sentir às vezes como se estivéssemos remando contra uma tsunami de crenças consolidadas.
Foi com este sentimento que li a pequena entrevista do economista Hugo Penteado, publicada no Globo deste sábado (7/4/2007). Ele pega pesado na crítica à obsessão global pelo crescimento: “Há muita ênfase no crescimento econômico como solução, embora ele sempre venha acompanhado de ruína social e ambiental. (...) Vive-se na armadilha do ‘quanto mais cresço tenho de crescer’. Isso acontece porque, sem crescimento, os sistemas corporativos e tributários irão à falência.”
Penteado é economista chefe do ABN Amro Asset Management. Registre-se que as gestoras de ativos (asset management) são hoje o coração dos mercados globais (se é que se poder dizer que mercado tem coração). Sua entrevista revela – ao menos para mim – a possibilidade promissora de haver espaço para a crítica, no centro do capitalismo pós-moderno, aos ‘consensos econômicos globais’, ‘convergências da doutrina econômica’ e toda a pregação que quer eternizar a ditadura do ‘pensamento único’ sobre as decisões econômicas dos indivíduos e sociedades.
Revisão de mitos da teoria econômica
A entrevista foi publicada na edição especial sobre meio ambiente da coluna ‘Negócios & Cia’, da jornalista Flávia Oliveira, o que revela outra possibilidade igualmente promissora: a preocupação com o colapso ambiental em curso pode propiciar o questionamento mais contundente e para um público mais amplo daquilo que Penteado chama de “mitos da teoria econômica”.
Ele preconiza a revisão destes mitos e também pega pesado: “(...) há um custo ecológico que jamais foi incluído nos preços das matérias primas. (...) A razão pela qual o sistema de preços e o livre funcionamento dos mercados não são capazes de precificar o custo ecológico e deter a devastação está em nossos valores. A ideologia de negação do custo ecológico é validada pelas teorias econômicas que regem as políticas atuais. Elas trabalham com a premissa de que o sistema econômico é neutro para o meio ambiente e que o meio ambiente é inesgotável”.
Penteado alerta para ameaças relacionadas aos projetos de produção de biocombustíveis e à crescente demanda por água. “É por essa porta que vamos viver uma crise de cunho econômico, político e ambiental. Será uma crise emblemática de nossos erros teóricos”. Ele também assinada o risco de colapso ambiental na hipótese ascensão material das quatro bilhões de pessoas (dois terços da humanidade) aos padrões de consumo dos demais. “A marginalização econômica, embora antiética, indesejável e arriscada, tem efeito positivo no meio ambiente”.
As considerações de Penteado não são originais, mas entendo que merecem atenção, seja pela posição do autor seja por terem sido veiculadas para um público que vem sendo bombardeado há anos com a idéia de que o mercado é a referência absoluta de tudo, é onipotente e vai, portanto, nos levar à salvação, sempre. Ora, será que o anátema da crítica ao mercado começa se ser flexibilizado lá no núcleo duro do sistema, onde se decide onde se põe e de onde se tira o dinheiro?
Repensar o crescimento e os padrões de consumo
Mas, se os ecos da entrevista de Penteado soam promissores por nos trazerem a esperança da crítica, também são tristemente perturbadores por conterem a desesperança do impasse, da falta de saída. Cabe, portanto, problematizar pelo menos duas de suas questões:
1) O crescimento econômico é necessariamente causa de ruína social e ambiental? Será mesmo que é impossível crescer sem destruir o meio ambiente e sem alargar o abismo entre ricos e pobres? Ou melhor, é possível preservar o meio ambiente e aproximar os padrões de vida de pobres e ricos sem crescer a economia?
2) A única forma de elevar o padrão de vida dos pobres é universalizar os padrões de consumo (e talvez de desperdício) dos ricos? É preciso repensar o padrão de consumo de todos, inclusive dos ricos? É possível transferir renda, conhecimento e poder aos mais pobres? Isso significa necessariamente perda ou ameaça aos mais ricos?
Creio que vale apostar na capacidade acumulada pela humanidade de produzir conhecimento, criar soluções e superar limites. Estamos tão acostumados com a ganância e o poder destrutivo do homem que nos esquecemos que a nossa potência criativa também promove comunhão e constrói.
É bom quando a gente ouve ou lê alguma coisa que reforça nossas poucas certezas e as muitas desconfianças e dúvidas, principalmente quando elas nos fazem sentir às vezes como se estivéssemos remando contra uma tsunami de crenças consolidadas.
Foi com este sentimento que li a pequena entrevista do economista Hugo Penteado, publicada no Globo deste sábado (7/4/2007). Ele pega pesado na crítica à obsessão global pelo crescimento: “Há muita ênfase no crescimento econômico como solução, embora ele sempre venha acompanhado de ruína social e ambiental. (...) Vive-se na armadilha do ‘quanto mais cresço tenho de crescer’. Isso acontece porque, sem crescimento, os sistemas corporativos e tributários irão à falência.”
Penteado é economista chefe do ABN Amro Asset Management. Registre-se que as gestoras de ativos (asset management) são hoje o coração dos mercados globais (se é que se poder dizer que mercado tem coração). Sua entrevista revela – ao menos para mim – a possibilidade promissora de haver espaço para a crítica, no centro do capitalismo pós-moderno, aos ‘consensos econômicos globais’, ‘convergências da doutrina econômica’ e toda a pregação que quer eternizar a ditadura do ‘pensamento único’ sobre as decisões econômicas dos indivíduos e sociedades.
Revisão de mitos da teoria econômica
A entrevista foi publicada na edição especial sobre meio ambiente da coluna ‘Negócios & Cia’, da jornalista Flávia Oliveira, o que revela outra possibilidade igualmente promissora: a preocupação com o colapso ambiental em curso pode propiciar o questionamento mais contundente e para um público mais amplo daquilo que Penteado chama de “mitos da teoria econômica”.
Ele preconiza a revisão destes mitos e também pega pesado: “(...) há um custo ecológico que jamais foi incluído nos preços das matérias primas. (...) A razão pela qual o sistema de preços e o livre funcionamento dos mercados não são capazes de precificar o custo ecológico e deter a devastação está em nossos valores. A ideologia de negação do custo ecológico é validada pelas teorias econômicas que regem as políticas atuais. Elas trabalham com a premissa de que o sistema econômico é neutro para o meio ambiente e que o meio ambiente é inesgotável”.
Penteado alerta para ameaças relacionadas aos projetos de produção de biocombustíveis e à crescente demanda por água. “É por essa porta que vamos viver uma crise de cunho econômico, político e ambiental. Será uma crise emblemática de nossos erros teóricos”. Ele também assinada o risco de colapso ambiental na hipótese ascensão material das quatro bilhões de pessoas (dois terços da humanidade) aos padrões de consumo dos demais. “A marginalização econômica, embora antiética, indesejável e arriscada, tem efeito positivo no meio ambiente”.
As considerações de Penteado não são originais, mas entendo que merecem atenção, seja pela posição do autor seja por terem sido veiculadas para um público que vem sendo bombardeado há anos com a idéia de que o mercado é a referência absoluta de tudo, é onipotente e vai, portanto, nos levar à salvação, sempre. Ora, será que o anátema da crítica ao mercado começa se ser flexibilizado lá no núcleo duro do sistema, onde se decide onde se põe e de onde se tira o dinheiro?
Repensar o crescimento e os padrões de consumo
Mas, se os ecos da entrevista de Penteado soam promissores por nos trazerem a esperança da crítica, também são tristemente perturbadores por conterem a desesperança do impasse, da falta de saída. Cabe, portanto, problematizar pelo menos duas de suas questões:
1) O crescimento econômico é necessariamente causa de ruína social e ambiental? Será mesmo que é impossível crescer sem destruir o meio ambiente e sem alargar o abismo entre ricos e pobres? Ou melhor, é possível preservar o meio ambiente e aproximar os padrões de vida de pobres e ricos sem crescer a economia?
2) A única forma de elevar o padrão de vida dos pobres é universalizar os padrões de consumo (e talvez de desperdício) dos ricos? É preciso repensar o padrão de consumo de todos, inclusive dos ricos? É possível transferir renda, conhecimento e poder aos mais pobres? Isso significa necessariamente perda ou ameaça aos mais ricos?
Creio que vale apostar na capacidade acumulada pela humanidade de produzir conhecimento, criar soluções e superar limites. Estamos tão acostumados com a ganância e o poder destrutivo do homem que nos esquecemos que a nossa potência criativa também promove comunhão e constrói.
1 Comments:
At 4:04 PM, Pina Jr said…
O mundo antevisto pelas indagações no final do texto é possível dentro do sistema capitalista que aí está? Como poderíamos resolver contradições insolúveis inerentes ao capitalismo? Há que se ter esperança e que se buscar saídas, mas sem perder a noção do que representou e representa o sistema capitalista para a evolução da humanidade.
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