Este mundo possível

Pensamento e ação aqui e agora.

domingo, setembro 03, 2006

Faz que não vê

Tenho a alegria de informar que o romance Faz que não vê chega às livrarias esta semana com o selo da Editora Garamond. É o meu primeiro livro publicado. Trata-se de um thriller político que tem como pano de fundo o universo sedutor do poder e a busca, a qualquer preço, da satisfação de desejos, necessidades e ambições.

O livro conta a história de um ex-guerrilheiro que se converte em yuppie nos anos 90 e se envolve numa trama em que se misturam negócios, política e crime. Construído de cenas interdependentes, o romance é ambientado na atmosfera de grandes empresas, gabinetes de autoridades, casas luxuosas e esconderijos de criminosos, conduzindo o leitor aos meandros do submundo que todos nós conhecemos, mas, muitas vezes, tentamos não ver e esquecer.

Comecei a escrever este livro em 2001 e terminei em 2005. Uma das motivações e pretensões do romance era refletir sobre a tensão ética e descrever os bastidores do comportamento de uma parte da geração, na qual me incluo, que sonhou e desejou muito, se apaixonou pelo sonho e não mediu sacrifícios pelo desejo, e parece estar vivendo a frustração de entregar muito pouco: algumas mudanças talvez para melhor e outras muitas para pior.

Como construção literária, o projeto era contar uma história interessante, com bastante ritmo, numa atmosfera de niilismo e desencanto político. Escolhi o tempo da era Collor e uma trama povoada de empresários, políticos, sindicalistas e criminosos envolvendo interesses na decadente Zona Portuária do Rio de Janeiro.

A idéia e o início do livro antecederam, portanto, a eleição de Lula em 2002. A trama da história e o drama dos personagens também nasceram nesta ocasião. Nunca duvidei da lição cotidiana de que a realidade é mais forte que a ficção. E fui comprovando isso dia a dia, na medida em que ia escrevendo e acompanhava cada capítulo dos acontecimentos que produziram a presente crise política no país, tendo como protagonistas alguns dos mais destacados líderes e ídolos da geração política que resistiu à ditadura e acreditou na revolução.

Ao mesmo tempo, eu verificava - às vezes com espanto - a correspondência entre as diferentes erupções da tensão ética dos personagens do romance e o comportamento dos atores da nossa crise política. E isso reforçava aquela motivação original do livro.

Foi com sentimento de orgulho um tanto constrangido que, há alguns meses, recebi do amigo e mestre Antonio Torres o texto da orelha do livro, destacando que o enredo do romance funcionou como trama e também como representação de um sistema que se agiganta como poder paralelo e ameaça a todos enovelar em sua teia, atravessando diferentes eras e governos. Assinalo, de minha parte, que não quis fazer no romance qualquer julgamento moral nem aposta política ou existencial, a não ser na crença de que não há saída da realidade para a utopia e, portanto, que não há como fugir de nós mesmos nem do aqui e agora.